Sobre debates produtivos

Nessa época de eleições, ocorrem debates entre candidatos na TV. Na sua maior parte, esses eventos acabam sendo uma oportunidade para a troca de insultos e propaganda grátis, e raramente representam um debate de fato. Debates, na verdade, fazem parte dos primórdios da lógica, e, logicamente, o objetivo nunca foi insultar o adversário ou enaltecer o aliado. Em um debate existem sim dois (ou mais) lados: o proponente e o oponente, em termos técnicos. O papel do proponente é propôr uma idéia, e o papel do oponente é desafiar essa idéia.

Pode parecer uma atividade combativa, mas não é. No final das contas, o objetivo é entender se a idéia é válida, ou em que condições ela seria válida. E isso só se descobre colocando essa idéia em cheque de todos os modos possíveis. O objetivo é aumentar o entendimento de todos sobre aquela idéia, e não “vencer” (seja lá o que isso significa) ou “convencer o outro”.

Na prática, debates (produtivos) entre dois lados aparentemente contraditórios servem para:

  1. Cada lado entender um pouco mais das motivações do outro, e
  2. fortalecer ou refinar os argumentos que a gente tem sobre algum assunto (ou seja, aprender).

Quando um lado faz pergunta pro outro o objetivo não é desafiar ou discordar, mas entender (ponto 1). E quando a gente tem que explicar nossas convicções pra outras pessoas, temos que pensar porque temos essas convicções e em que elas são baseadas (ponto 2). Ou seja, um debate produtivo contribui para o aumento do entendimento global. Infelizmente, as pessoas costumam reagir muito mal a qualquer questionamento que pareça desafiar suas afirmações ou exija um pouco de reflexão. E acabamos assim, com “debates” onde cada um fala pra si próprio, e ninguém realmente aprende.

Eu senti necessidade de esclarecer isso depois de muitas e muitas tentativas frustradas da minha parte de discutir política com algumas pessoas. Eu já discuti muito política na vida. Sinceramente, no início eu não sabia de muita coisa (eu continuo não sabendo, mas a curva é monotonicamente crescente). Mas a gente ouve as outras pessoas, faz perguntas, desafia suposições, pesquisa na internet… E nesse caminho eu aprendi muito. Lembro de discussões muito interessantes e produtivas sobre inflação, cotas nas universidades, voto obrigatório, aprovação de leis, corrupção (e as motivações e implicações sociais), índices econômicos, PIB… enfim. Uma variedade de assuntos! E um tanto de gente bem intencionada me ensinou muito sobre essas coisas durante discussões. Seja sobre partes técnicas do assunto que eu de fato ignorava, seja sobre consequências ou causas que eu não tinha considerado, ou sobre outras opções que eu nem sabia que existia. E talvez elas também aprenderam um pouco no processo, nem que seja como explicar as coisas que elas sabem de modos diferentes. E nem sempre a gente concordava no início, e nem sempre concordava no final. Mas isso não importava.

Infelizmente a coisa ficou feia de uns anos pra cá, e ninguém mais parece ter saco pra isso. Eu tentei, com a melhor das intenções possíveis, pedir uma elaboração de argumentos, perguntar, ou apresentar contra-exemplos a várias pessoas que me apresentaram idéias das quais eu discordo. E é muito, mas muito frustrante mesmo, quando alguém vira e fala “mas é minha opinião e eu não vou mudar e você não vai mudar então essa discussão é inútil”. Quer me matar de raiva é terminar um assunto assim. Cá estou eu, tentando entender o que pra mim parece incompreensível, e ninguém disposto a explicar a não ser com argumentos vazios e sem fundamentos. E que, ao invés de refletir sobre ou fortalecer seus argumentos quando eu faço perguntas, fecha a cara e vai embora. Isso pra mim não é opinião, é teimosia e preguiça de aprender. E se não quer aprender sobre um assunto ou fundamentar suas opiniões devidamente, não me venha apresentar ele como se fosse “a sua verdade”. Conhecimento não é fé.