Sobre a política brasileira

Recentemente a Marina Silva decidiu juntar esforços para criar um novo partido político no Brasil. Eu li sobre ele, seu estatuto, vi algumas entrevistas e resolvi apoiá-lo. Eu não sou o tipo de pessoa politicamente engajada, mas ultimamente eu tenho prestado atenção na política do Brasil. A visão que eu tive, de fato, não é bela. A governança é muito complicada, e as boas intenções ficam perdidas em um processo longo, burocrático e muito dependente de troca de favores. Eu fico triste em ver como uma coisa tão importante para o desenvolvimento e organização de um país, quando visto de perto, pode se reduzir a um processo tão mesquinho. Mas é melhor eu explicar o que eu vejo, porque a gente tem olhos diferentes.

O trabalho de um político é discutir e propor leis (projetos de lei, medidas provisórias, emendas na constituição, etc.) com o objetivo de melhorar o país. Isso é um processo democrático, e os políticos votam nas leis uns dos outros e elas só são aprovadas se obtiverem uma certa porcentagem dos votos. Até que não parece tão mal, certo? Mas aí eu comecei a acompanhar notícias, ler sobre a tramitação (uma palavra elegante para o vai e vem que uma proposta sofre antes de ser definitivamente aprovada ou reprovada) dessas leis e entender realmente como isso funciona.

Pra começar, não existe essa coisa de discutir antes de elaborar uma lei. Cada um trabalha mais ou menos independente, e propõe leis ao seu bel prazer. Às vezes acontece de um grupo elaborar alguma lei, mas em geral, as leis têm como autor uma pessoa só. Bom, vamos supor que todos estejam interessados no bem comum (e ignorar projetos propostos para benefício próprio ou irrelevantes). Hoje o Brasil tem 513 deputados (mais o Senado, câmaras, comissões, presidente, tribunais, etc.) que podem propor leis. Então a gente tem um monte de propostas por aí, e os políticos devem ler essas propostas, sugerir mudanças (emendas), revisar as mudanças, revisar as emendas sugeridas para as suas próprias propostas e votar. Só que é muita coisa! Só em 2012, foram 1841 propostas, em 2013 já são 638, e isso são só projetos de lei. Existem quase 400 propostas em regime de urgência. O Brasil vive um momento relativamente estável, será que esse tanto de lei é necessário? Será que não existe um monte de assuntos com vários projetos de leis diferentes?? Por que as pessoas interessadas no mesmo assunto não se reuniram antes pra discutir como (e se) deveria ter uma lei pra isso? O processo pelo qual passa uma proposta é longo e burocrático, e se as propostas forem menos e mais coesas, tudo ficaria mais fácil pra todos.

Então, no meio desse mar de sugestões, como é que um deputado vota? Ele é afiliado a um partido político, então ele vota a favor de propostas de pessoas do seu partido e de partidos aliados. E ele vota contra propostas de partidos aos quais o partido dele faz oposição. Por que? Porque essas pessoas depois vão votar nas propostas dele, independente delas serem boas ou ruins para os eleitores, porque elas também querem o voto dele em alguma coisa. Ao meu ver, isso é uma luta cega por aprovação de propostas e parece que quem aprova mais, ganha. Mas ninguém está realmente prestando atenção se as coisas votadas são coerentes e de acordo com seus princípios ou não. Daí acontecem coisas do tipo a reforma do código florestal ser aprovada e o Marco Feliciano ser eleito presidente da comissão de direitos humanos… (o que não é uma lei per se, mas também depende de votações). Me parece que os políticos estão tão preocupados com a rede de favores que vai fazer com que eles consigam votos que, na hora de votar, pensam somente em quem vão agradar ou desagradar com seu voto (lá dentro, não a gente) e não em que se está votando realmente.

Entre o caos, surge a Marina Silva como candidata a presidente em 2010, dizendo que não vai fazer alianças ou prometer cargos, e sim chamar as pessoas mais competentes para cada trabalho. Ou seja, ela queria fazer o que é certo. O partido que ela quer criar agora não é diferente. Ela se recusa a assumir uma posição cega de apoio ou oposição ao governo e afirma que vai apoiar o que é bom e criticar o que é ruim. Diz também que não vai fazer alianças com partidos políticos, mas pode apoiar candidatos de outros partidos que tenham uma causa compatível com os ideais do novo partido. No meu ponto de vista ela está tentando acabar com o jogo de interesses e focar novamente na qualidade das propostas, e não em quem está por trás delas.

Ao perguntar a algumas pessoas o que elas achavam, fiquei surpresa ao descobrir que a maior crítica é exatamente a que, na minha opinião, são seus pontos fortes. As pessoas dizem que existe uma falta de posicionamento porque a Marina não adotou um rótulo direita/esquerda ou pró/contra o governo. Mas na verdade ela está disposta a apoiar o que é bom em todos os lados. O problema em escolher lados é que você acaba ficando preso a uma filosofia ou pensamento, e quando vê algo bom em outro lado, ou você não apoia por teimosia, ou apoia e corre o risco de ser chamado de hipócrita e perder a credibilidade. Qual o problema em não tomar lados e analisar, o mais imparcialmente possível, as ações de todos os lados e decidir qual é a melhor no momento?
As pessoas dizem também que ela não consegue ganhar uma eleição ou governar sem fazer alianças porque “é assim que o sistema funciona”. Pra mim é muito claro como essas alianças atrapalham o poder de julgamento dos deputados, e mesmo que alguém me diga que o projeto X só foi aprovado por causa de alianças, eu digo que se os políticos analisassem objetivamente e X fosse um bom projeto, ele seria aprovado de todo jeito. É óbvio, pelo menos pra mim, que quanto menos interesses estiverem envolvidos na votação de um projeto, mais objetiva será sua análise. Então por que não acabar com as alianças políticas? “Porque é assim que o sistema funciona” é uma desculpa muito ruim. Tantas coisas já mudaram! Eu não sei que incredibilidade é essa. Afinal de contas, quem vota é a gente, e se quisermos eleger só candidatos sem alianças, dispostos a lutar pelo bem coletivo (seja lá qual seja sua definição de bem coletivo, existem várias delas e várias ideologias defendendo cada uma), basta votar neles. Eles são poucos, mas eu finalmente acredito que eles existem.

Deixo aqui meu apelo por eleitores, candidatos e políticos mais transparentes, simples, objetivos e unidos pelo bem de todos.